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Novo consumidor

Profa. Karine Karam

O comportamento do consumidor durante o isolamento social.


Com a quarentena, os modos de consumo sofreram uma ressignificação. Tudo precisou ser adaptado. O consumidor passou por um processo de reflexão nas diversas dimensões de sua vida: profissional, financeira, relacional, consumo, no seu jeito de se alimentar, no modo de praticar atividades físicas em tudo.


A frenagem brusca no consumo gerou um grau de racionalização que há tempos não víamos no ambiente de marketing. Aconteceu algo inimaginável.

O comportamento do consumidor vem se alterando e provavelmente não voltará a ser como antes. Novos modos de ser estão emergindo.

Para entender os sentimentos e as expectativas das pessoas em relação ao isolamento social e à pandemia de covid-19, a ESPM Rio, escola de negócios referência nas áreas da Economia Criativa, realizamos uma pesquisa quantitativa online, entre os dias 28 de abril e 1º de maio, com 300 participantes, no Rio de Janeiro (a maior parte da amostra), em São Paulo e em Brasília.

O estudo mostrou que o isolamento social transferiu o consumo da rua para casa e a desaceleração do consumo gerou um nível de consciência maior, ou seja, o comportamento do consumidor está mais racional, alterando suas percepções sobre marcas, pessoas, sentimentos.

Esta racionalidade é evidenciada quando o consumidor reverencia empresas que desempenham um papel cada vez mais presente nas questões que envolvem a sociedade. Nunca foi tão importante para as marcas terem um propósito claro e aderente ao cenário atual.  O estudo mostrou que marcas com essa atitude são lembradas de forma positiva. A primeira a ser destacada nesse perfil pelos entrevistados foi Magalu. A empresa, uma das maiores plataformas de varejo do país, anunciou medidas para reduzir os impactos causados pela Covid-19, preservando funcionários, clientes e a sustentabilidade dos negócios. Na contramão, a marca mais lembrada negativamente, foi a rede Madero, de hambúrgueres. No início da pandemia, seu fundador, Júnior Dursk, afirmou em um vídeo que a economia não poderia parar, ainda que mortes ocorressem.  A influenciadora Gabriela Pugliesi, que recentemente teve seus contratos publicitários cancelados após quebrar a quarentena, também foi citada por alguns entrevistados como marca negativa.

O relaxamento do isolamento social, que tem sido registrado em algumas capitais nos últimos dias, se reflete na atitude da maioria dos que participaram do estudo.  55,6% dos entrevistados disseram só sair de casa quando é necessário ir ao supermercado. E 22,5% afirmaram não sair para nada.

O confinamento, porém, já é refletido no aspecto emocional dos entrevistados. As sensações mais citadas pelas pessoas ouvidas na pesquisa do Rio foram ansiedade, angústia e preocupação.

Efeitos no Consumo

Material para escritório e artigos de limpeza são os produtos mais consumidos no período de isolamento, segundo os entrevistados. O resultado é consequência direta da adoção do home office por muitos profissionais brasileiros. Compras online foram realizadas pelo menos uma vez por 45% dos entrevistados durante o isolamento. E, desse total, 70% compraram produtos para melhorar o conforto da casa -- com destaque para máquinas de lavar louça e itens relacionados ao trabalho ou estudo, como fones de ouvidos, teclados e impressoras. Sete em cada dez entrevistados estão preocupados com a qualidade dos produtos de limpeza. Além disso, arrumar a casa está entre as atividades mais frequentes nesse período, juntamente com ver séries e filmes, trabalhar e estudar. 


No primeiro estudo feito no 1º mês do isolamento social, 30% das pessoas disseram estar bebendo mais álcool, já no segundo estudo, após dois meses de isolamento, este índice atingiu 45%, não por acaso a venda de bebida alcoólica registra altos índices de crescimento tanto no ambiente online quanto nas lojas físicas.

Passando mais tempo em casa, alguns itens tornaram-se mais relevantes para os consumidores por terem mais tempo para observar sua própria casa.



O que mais faz falta

De que as pessoas mais estão sentindo falta durante a quarentena? Opções relacionadas ao convívio social foram as mais escolhidas. Ver os amigos foi mencionado por 76% dos entrevistados, visitar parentes por 65% e frequentar bares e restaurantes por 60%. 

Difícil prever como será a sociedade pós-covid. Mas, por ora, as pessoas afirmam que muitos hábitos de consumo vão mudar -- 43% apontaram que passarão a comprar menos e 42% acreditam que vão economizar mais daqui para a frente. Outros comportamentos assinalados foram: ficar mais tempo com a família, cuidar da saúde e ter uma vida mais simples.


Em outra pesquisa quantitativa online realizada por mim e Ana Erthal também pesquisadora do Crio, com 403 respondentes que moram e ou trabalham no Rio de Janeiro, realizada entre os dias 12 e 21 de abril de 2020, tentamos entender a percepção dos moradores do Rio de Janeiro em relação ao impacto do isolamento social, avaliamos quais as saudades do carioca neste período, analisando o que as pessoas estão sentindo falta em suas sensorialidades: seus cheiros, gostos, sons, toques e visões.

Ao entender como se dá a relação afetiva dos moradores do Rio com a cidade, percebemos que 94% dos entrevistados admiram o patrimônio e a história do Rio e 80% amam morar, viver e trabalhar no Rio. E, apesar de 88% adorarem a diversidade cultural existente no Rio, 99% reconhecem que existe uma enorme diferença de classes na cidade. E 43% discordam da imagem de cidade maravilhosa.


Os cariocas estão sentindo falta de muitas coisas, saudade de ver, de ouvir, do gosto, do contato físico e do cheiro. Através desta pesquisa conseguimos avaliar que os entrevistados estão nostálgicos de ver muitas coisas, mas as maiores saudades são ver o verde da natureza abundante (88%), de ver o movimento alegre dos bares (73%) e o vai-e-vem das pessoas (67%). Por outro lado, a menor das saudades é ver o movimento de carros nas ruas, onde apenas 1 em cada 5 sentem falta.


Em relação aos barulhos, os sons que os cariocas estão mais sentindo falta é do barulho das ondas do mar (61%) e da música dos artistas de rua (51%) e a saudade mais surpreendente é o som das crianças no caminho do colégio (50%). Um barulho que não deixa saudade é o das buzinas e dos motores de automóveis.

Quando falamos no paladar, apesar de mais da metade estar com saudade da água de coco na praia, as maiores nostalgias estão relacionadas ao vinho com os amigos (65%), o café na padaria (64%) e o chope gelado (61%).


O carioca está sentindo falta de contato físico, principalmente do abraço dos amigos e parentes (96%), o afago das mãos dos pais e avós (84%) e de compartilhar os espaços públicos (72%) e 4 em cada 10 está sentindo falta até mesmo da praia lotada aos domingos.

Quem não gosta do cheirinho do pão da padaria, do aroma da pipoca do cinema e do cheiro da chuva? Os moradores do Rio disseram que estes são os cheiros que deixaram mais saudades no período de isolamento. Um terço dos entrevistados está sentindo falta do cheiro das pessoas.


Não podemos deixar de analisar o carioca sob sua diversidade. As opiniões variam muito em termos de classe e região da cidade. Enquanto na zona sul apenas 36% discordam de que o Rio é a cidade maravilhosa, na Baixada fluminense o nível de discordância é de 62%. Na zona sul, 52% das pessoas sentem falta do por do sol, enquanto na Zona Norte apenas 26% sentem saudade dele. Outro aspecto interessante em termos de classe é que, enquanto apenas 17% das pessoas da classe A sentem saudade dos ritos de celebração religiosos, nas classes DE, 40% sentem falta.


60% das pessoas da classe A sentem faltam da água de coco, mas na classe D, 39% dos cariocas, sentem saudade. Já o churrasquinho e cachorro quente de rua é o paladar que


29% das pessoas das classes AB sentem faltam, mas nas classes DE é uma saudade para 60% das pessoas.


Para não falar só as diferenças, a saudade do chope gelado une os cariocas de todas as classes e todas as regiões.


A vida financeira

Outro estudo feito on line com 1200 entrevistados no Brasil, mostra que a pandemia, o isolamento social e os efeitos sobre a economia já afetam a renda de mais da metade dos consumidores, 52% deles tiveram redução de renda, enquanto para 31% das pessoas esse recuo nos rendimentos foi de 50% ou mais. Isto porque a pesquisa on-line pega um público de classes mais altas, se neste grupo houve impacto, imagine no resto.

O levantamento foi encerrado no dia 15 de maio e incluiu as cidades de Rio de Janeiro, São Paulo, Curitiba, Porto Alegre, Brasília, Goiânia, Manaus, Fortaleza, São Luís, Salvador, Rio Branco e Belém.

É perceptível, com base nas informações sobre ações de desligamento de diversas empresas de vários setores da economia, que esse impacto está sendo crescente no emprego e renda. Tivemos uma frenagem brusca do consumo, fomos obrigados a ficar em casa, o comércio foi impedido de funcionar. Qual o impacto para a indústria? Queda de receita. Qual é o impacto inicial pra gente? Não poder comprar. Então as empresas correram para a digitalização. Esse foi o primeiro momento da pandemia.

A partir do momento em que as receitas começaram a cair, as companhias começaram a fazer reestruturações para conseguir passar o período de crise e no momento em que as pessoas têm redução salarial e, na pior das hipóteses, perdem seu emprego, há uma segunda frenagem do consumo, o que eu chamaria de um segundo efeito sobre o consumo.

E o terceiro efeito diz respeito a uma reflexão sobre a forma como consumimos. Nesse sentido, vale citar uma outra pesquisa qualitativa feita com 30 entrevistados no Brasil, sendo seis em cada uma das cinco regiões do país, onde notamos no discurso muita consciência e moderação nas narrativas de consumo como podemos notar na fala desta informante de são Paulo:


- “Eu reduzi meu cartão à metade e fico me perguntando onde gastava o resto. Eu comprava muito por impulso, agora eu paro, penso se realmente preciso, reflito”.

Apesar disso, alguns segmentos faturaram mais como todos os itens relacionados à praticidade da casa: o lençol melhor, máquina de lavar louça, a cadeira melhor e itens relacionados ao home office também aumentaram.

A pesquisa vai além dos efeitos sobre a renda, 69% das mulheres estão se sentindo mais sobrecarregadas ao ter que conciliar trabalho, escola dos filhos e tarefas domésticas e nesse ambiente de maior sobrecarga, os entrevistados buscam dar maior atenção ao que consideram mais positivo durante o isolamento. Perguntamos o que é mais positivo e as respostas apontam que é estar mais perto dos filhos e da família.

Em outros estudos feitos na minha consultoria Markka onde foram feitas 4 ondas de pesquisa visando o comportamento durante o primeiro mês da pandemia do covid-19 no Brasil, desde o início do período de isolamento social observamos, durante as pesquisas, uma mudança de sentimentos e expectativas por parte dos respondentes.

Em um primeiro momento, quando questionados se estavam cumprindo de fato a quarentena, cerca de 52% disseram estar cumprindo, em parte, o isolamento social, saindo somente para comprar itens de mercado e para caminhar. Os mais velhos, acima de 61 anos, forma os que mais aderiram ao isolamento total.

Os consumidores paranóicos que liam notícias o tempo todo na primeira semana (35%), deram espaço, depois de um mês, para consumidores que tentam encontrar um equilíbrio (76%). Manaus é a capital com maior % de consumidores que se classificaram como paranóicos e também em negação.

Com relação às expectativas e impactos, para todos os profissionais a maior preocupação é sempre com a saúde (62%). Mas, os profissionais liberais são os que mais se preocupam com o impacto na economia (29%) e os funcionários públicos são os que mais se preocupam com a saúde (73%).

Quando olhamos as expectativas por idade, percebemos que os mais velhos (41 a 61+) são os que mais se preocupam com a economia (31%), enquanto os mais jovens, até 18 anos, são os que menos se preocupam (16%). E quando olhamos a expectativa por classe social, percebemos que as classes mais altas, A e B, são as que tem a maior preocupação com a economia, 33% e 32% respectivamente.

A preocupação financeira, que era o principal sentimento até a 2º semana, se transformou em ansiedade. Na 2º semana, 33% estavam preocupados com a sua situação financeira e, após 1 mês, o principal sentimento passou a ser a ansiedade. Consequentemente, os consumidores passaram a comer mais do que deveriam, de 21% na 2º semana para 28% após 1 mês.

Após esse tempo de isolamento, os mais velhos (acima de 61 anos) são os mais preocupados também com a crise econômica(51%) e irritados/ cansados com as atividades domésticas (16%). Por outro lado, os mais jovens(até 18 anos) são os mais ansiosos, estão comendo mais do que deveriam, e também os mais impacientes com a família (11%).

Enquanto a classe A está mais ansiosa, comendo mais, e irritada/cansada em fazer atividades domésticas (33% para cada), as classes B e C são as mais preocupadas com a crise econômica que virá depois desse período de isolamento.

Sobre os hábitos de consumo durante a pandemia, eles mudaram, e isso e ninguém tem dúvidas. As prioridades de compra e de uso de serviços são outras, e agora tudo gira em torno de uma melhor adaptação à nova rotina.

Desde o início do período de isolamento social as pessoas têm passado a gastar menos com restaurantes e bares presenciais (71%), cinema, teatro e shows (71%) e também com roupas e sapatos (69%), e, mesmo com o fim da quarentena, acreditam que ainda vão consumir menos do que antes do isolamento em bares e restaurantes presenciais. Além disso, comidas de delivery também tendem a ser menos pedidas em casa após tudo isso.

Em relação às compras em mercados e hortifrutis, e o consumo de produtos de beleza e farmácia, os entrevistados consideram que se manterá igual, tanto na quarentena quanto depois do período de isolamento. Além desses itens, outro que, segundo a pesquisa, permanece com a mesma intenção de consumo durante e após o isolamento social, é o de educação (escola, faculdade e cursos).

Sendo assim, pensando no fim do isolamento, algumas pessoas dizem que vão consumir menos moda (roupas, sapato e bolsas) e viagens, o que é um reflexo do fato de que muitos pensam em rever os padrões de consumo e gastar somente com o necessário após esse período, segundo 33% dos entrevistados.

Como nada é tão ruim, o isolamento também trouxe uma perspectiva positiva sobre a vida. Neste sentido, 53% disseram gostar de ter mais tempo com a família, 42% valorizaram ter mais tempo para pensar na vida, o mesmo percentual curtiu mais a casa, 41% estão felizes por perder menos tempo no trânsito e surpreendentemente 37% gostaram de arrumar mais a casa.


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